Quando há cerca de uns sete anos atrás foi-me dito por um médico de oftalmologia que a minha doença retinose pigmentar estava a se manifestar rapidamente, e que caminhava a passos largos para a cegueira, deparei-me com um percurso que eu não estava à espera.
Sim, eu sabia que tinha uma doença hereditária que cedo ou
tarde se manifestaria. O que não sabia era que esta doença iria se manifestar
tão cedo, e exatamente quando parecia que estava a concretizar alguns dos meus grandes projetos que idealizei para a minha vida.
Na altura era funcionária pública e estava a tirar o curso
superior de Solicitadoria. Diante de
livros e livros que tinha de ler, fui confrontada com esta metamorfose na
minha vida. Todo e qualquer projeto que
eventualmente pudesse estar a planear para o futuro já teria de ser revisado.
Quando nos dizem que podemos ficar cegos de um dia para o
outro, isto quer dizer que vamos ter diante de nós uma dificuldade acrescida
pela falta de um dos sentidos mais essenciais do ser humano.
No início fiquei como que diante de uma porta que se fechava,
vendo outra abrir que não esperava que abrisse tão cedo.
A porta que se fechava era a visão… E a porta que se abria
chamava-se “baixa visão”. Mas afinal o que é a baixa visão?
Só aos poucos compreendi, que a cegueira progressiva é como
que uma grande montanha que está à nossa frente, a que chamam baixa visão.
Esta montanha está ali ao meio do nosso caminho de vida. Diante
desta montanha só nos resta duas opções: ou galgamos a montanha, e nos readaptamos gradualmente com a baixa visão, ou então deixamo-nos estar ali
parados à espera que a cegueira nos leve aonde ela nos levar, sem nos importarmos
mais com os nossos objetivos de vida.
Sim, é mais fácil ficar ali numa espécie de elevador, deixando-nos
ir pela dependência progressiva dos outros e das situações, ao sabor de um
destino inevitável que já nos derrotou.
Por isso, temos de estar assim como que cientes de uma
realidade que é irrevogável: - Estou a perder a visão!
Nos primeiros tempos, passei por uma espécie de luto, que na
altura não percebia muito bem. Todo o meu corpo chorava diante desta perda
irrevogável.
É preciso mesmo fazer todo este luto, passar por toda esta
perda, e da forma mais intensa possível, pois não se pode guardar dentro de nós
tamanha tristeza e seguir em frente.
É preciso fazer este enterro definitivo de uma tal visão que
antes tínhamos nos anos anteriores. É preciso sepultar certos preconceitos que
nos fazem crer que perder a visão vai nos deixar dependentes dos outros para o
resto de nossas vidas, pois já não vamos conseguir fazer as coisas como antes fazíamos.
Sim, não as podemos fazer como antes fazíamos mas as podemos fazer de uma
maneira adaptada às nossas limitações visuais.
É preciso colocar diante de nós toda esta verdade para que
possamos reconstruir a nossa história diante desta montanha da baixa visão que
nos caiu assim ao meio do nosso caminho.
É uma subida difícil, mas não necessariamente impossível de
percorrer.
O primeiro ímpeto que me ocorreu é que devia me abstrair de
toda a realidade, e que já não podia mais nada por mim e nem pelos outros.
Mas isso é um degrau que nos faz descer ainda mais, fazendo
a montanha subir e tornar-se ainda mais alta.
Enquanto perdi tempo a olhar para mim mesmo, perdi a
oportunidade de refazer estes conceitos sociais que me fazem crer que uma
pessoa com deficiência visual perde a sua autonomia.
Ao mesmo tempo, comecei a agarrar-me a quatro pilares que
fizeram e fazem parte da minha readaptação ao longo destes últimos anos.
No ano passado quando participei da terceira edição do
Congresso Online Internacional de Inclusão e Reabilitação da Pessoa com
Deficiência Visual promovido pelo Portal da Deficiência visual, escolhi o tema: “Os meus gatos e os quatro pilares que sustentam a minha readaptação como
deficiente visual”.
Fiz um vídeo para este seminário, e encontra-se disponível um
e-book que pode ser baixado gratuitamente que coloco à disposição de quem
quiser ler.
Na verdade, todo este artigo acerca dos gatos e dos quatro
pilares que me sustentam a minha readaptação como deficiente visual foi apenas
um pequeno degrau. Todos estes quatro pilares estão a crescer, de dia para dia,
pois os alicerces de uma readaptação são um processo em contínuo crescimento.
Falar de readaptação é falar de crescimento. E por isso, nos próximos artigos irei aprofundar ainda mais
estes quatro pilares, e como eles foram imprescindíveis na minha readaptação
como deficiente visual.
Até o próximo artigo e se gostou do que leu ou interessa-se por este assunto, siga-me neste
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Convido-lhe a ler o e-book “Os meus gatos e os quatro pilares que sustentam a minha readaptação como deficiente visual”