Nos dias 29 e 30 de maio de 2018, mais uma vez o Centro de
Reabilitação de Areosa realizou os dias abertos à comunidade com várias iniciativas, sendo o dia 29 especialmente direcionado para a deficiência
visual.
A abertura deste evento foi um grande momento musical com
Eduardo Santos Trio, bem como a presença do diretor do Centro de Reabilitação
de Areosa Dr. Afonso Lobão a dar as boas vindas a todos, especialmente às
entidades públicas convidadas e colaboradores.
O tema deste ano foi “Os loucos anos 20” e os alunos do
Centro fizeram um desfile de moda inspirado neste tema que culminou na coreografia:
“Charleston”.
Houve a apresentação da bengala eletrónica (Doutor João
Barroso professor associado da UTAD) e também a apresentação do "talkback"
(Bib. Mun. de Vila Verde por Abílio Guimarães).
A meio da tarde, a gargalhada invadiu o centro com um momento
descontraído na apresentação da peça "As Padeiras de Valongo"
(Associação Cultural e Recreativa Fora d Horas).
Não faltou as várias exposições de arte e artesanato à venda
e feito pelos próprios utentes.
Particularmente, o que mais me chamou a atenção foi a
Exposição “História da Bengala Branca” em que contava o percurso do uso da
bengala ao longo dos anos e não faltou a bengala verde que, a meu ver, foi um
grande passo na identificação da baixa visão.
Ao percorrer esta exposição deparei-me com a realidade da
deficiência e o seu posicionamento ao longo dos anos. Houve tempos em que se
julgava a deficiência física como necessariamente deficiência mental, mas
felizmente, as próprias pessoas com deficiência física foram se integrando e
reivindicando a sua posição na sociedade.
Deixo aqui um agradecimento ao Centro de Reabilitação da
Areosa, especialmente ao professor Pedro que me apresentou a Bengala Verde há
uns três anos atrás, e desde então, a minha própria posição perante a deficiência visual mudou.
Quando resolvi contactar o Centro de Reabilitação da Areosa e pedir ajuda na minha readaptação perante a deficiência visual, não imaginava o que tanto iria aprender e conhecer neste serviço público totalmente gratuito, com professores e utentes que ao partilharem as suas experiências, tanto me apoiaram neste percurso difícil da perda da
visão.
E também nesta exposição lá estava a bengala verde e foi
impressionante ler as histórias que ali estavam representadas.
Claro que nem sempre a bengala foi assim leve e fácil de manejar
como agora se sente nas mãos. Já houve tempos em que se tinha de improvisar, e
várias histórias ali se contaram nos placares da exposição com fotografias que
nos interrogam acerca do que foi e é a deficiência, bem como o seu percurso ao
longo do tempo.
Entre estas histórias estava a história de um carrinho de
compras que foi a bengala de alguém.
Este alguém fui eu mesma.
Mas esta história deixo para contar mais em pormenor no meu próximo artigo, porque afinal isto de usar o carrinho, na verdade, era a minha vontade de
esconder que já não via o suficiente.
Para além da vergonha de se usar uma bengala de cegos quando ainda não se é cega totalmente, há a incompreensão do público em geral, ainda não esclarecido, acerca desta distância entre a cegueira total e a baixa visão.
E foi assim que a Bengala verde veio esclarecer um pouco esta questão.
Por quê a bengala verde é assim tão importante neste esclarecimento?
Ainda esta semana, quando fui ao supermercado aqui onde moro, estava a pagar as minhas compras, e a menina do caixa perguntou-me:
-A senhora usa a bengala porque tem problemas de
equilíbrio?
Respondi-lhe que não era isso, mas que eu usava a bengala porque via
pouco.
Perante isto de “ver-se pouco”, de imediato a menina da caixa, devido
certamente à sua falta de informação sobre o que é baixa visão, disse-me:
- Então porque não usa óculos?
Respondi-lhe que era deficiente visual, e isso nada tem a ver
com usar óculos ou não, com usar mais ou menos graduação. E por isso usava uma
bengala verde que se destinava a identificar exatamente as pessoas com baixa visão como eu.
Infelizmente, ser-se deficiente visual é um degrau bem mais acima disto de usar uns óculos por causa da graduação, e só compreende bem quem passa por isso …
E assim a minha bengala verde conta esta história todos os dias, quando desafia os outros a pensarem exatamente nisto tão esquisito de baixa visão, que nada tem a haver com usar óculos ou não, e que para andar em segurança, usa uma bengala parecida com a bengala de cegos…
A história da bengala branca continua, e fez-se verde por causa da baixa visão, e cada vez mais, alguns dos preconceitos e mentalidades acerca da deficiência visual, desmitificam-se, a partir de quem avance e dê um passo a frente!
Termino este artigo com esta placa que identifica o "Largo da Bengala Verde" no Centro de Reabilitação de Areosa. Isto significa o quanto aqui encontrei o respeito pelo meu tipo de deficiência, recebendo então a ajuda adequada e direccionada para a baixa visão.
Foi aqui e com esta bengala verde, que me libertei do uso do tal carrinho de compras, pois optar por usar uma bengala, não sendo totalmente cego, é o dar um passo mais além, muito além da deficiência ...